quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Numero 346



É... nao teve jeito de fugir do assunto "mensalão". Como poderia dizer a Cecilia Meireles, "esta palavra que ninguém sabe o que seja".
Mas adorei o comentário do jurista Celso Bandeira de Mello sobre a Veja: não leio publicações às quais não atribuo a menor credibilidade.
Falou e disse, Ministro!


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Celso Bandeira de Mello desmente revista Veja
Em nota, jurista desmente nota publicada pela Veja, segundo a qual ele estaria redigindo um manifesto contra a atuação dos ministros do STF no julgamento do mensalão. "Não tomei conhecimento imediato da notícia pois não leio publicações às quais não atribuo a menor credibilidade", disse Bandeira de Mello. E acrescentou: "não teria sentido concitar os encarregados de afirmar a ordem jurídica do País, a respeitarem noções tão rudimentares que os estudantes de Direito, desde o início do Curso, já a conhecem, quais as de que “o mundo do juiz é o mundo dos autos” – e não o da Imprensa.
Blog do Nassif
(*) Publicado no Blog do Nassif.

O jurista Celso Antônio Bandeira de Mello desmentiu nota publicada na edição 2.287 da revista Veja informando que ele estaria redigindo um manifesto criticando a atuação dos ministros do STF no julgamento do mensalão. Leia a declaração de Celso Antônio Bandeira de Mello:

Uma notícia deslavadamente falsa publicada por um semanário intitulado “Veja” diz que eu estaria a redigir um manifesto criticando a atuação de Ministros do Supremo Tribunal Federal no julgamento da ação que a imprensa batizou de mensalão e sobremais que neste documento seria pedido que aquela Corte procedesse de modo “democrático”, “conduzido apenas de acordo com os autos” e “com respeito à presunção de inocência dos réus”. Não tomei conhecimento imediato da notícia, pois a recebi tardiamente, por informação que me foi transmitida, já que, como é compreensível,
não leio publicações às quais não atribuo a menor credibilidade.

No caso, chega a ser disparatada a informação inverídica, pois não teria sentido concitar justamente os encarregados de afirmar a ordem jurídica do País, a respeitarem noções tão rudimentares que os estudantes de Direito, desde o início do Curso, já a conhecem, quais as de que “o mundo do juiz é o mundo dos autos” – e não o da Imprensa – e que é com base neles que se julga e que, ademais, em todo o mundo civilizado existe a “presunção de inocência dos réus”.


O que o caso Marcos Valério conta sobre a mídia brasileira
(Paulo Nogueira, no blog do Nassif)
Na condição de jornalista independente e apartidário, pronto a reconhecer méritos e defeitos de FHC ou de Lula ou de quem mais for, não posso deixar de comentar o episódio Marcos Valério e Lula. Minha experiência em redação pode eventualmente ajudar o leitor a entender melhor o que vê publicado.
Na essência, este caso ajuda a entender uma coisa: por que o poder de influência da grande imprensa se esvaiu tanto nos últimos anos. Note: não faz tanto tempo assim, Roberto Marinho era tido como a pessoa mais poderosa do país, capaz de eleger ou não quem quisesse. Sucessivos presidentes machucavam as costas para se curvar a Roberto Marinho e obter seu apoio, tido como fundamental.
Pela terceira vez seguida, a Globo não foi capaz de eleger seu preferido para a eleição presidencial. Todo o empenho de jornalistas em postos importantes da casa – de Kamel a Merval, de Noblat a Míriam Leitão, de Bonner a Waack, isso para não falar de colunistas como Jabor e entrevistados frequentes como Demétrio Magnoli – foi insuficiente para convencer os eleitores a votarem como a Globo desejava que votassem.
Isso é um dado importante e objetivo: esforço não faltou. Faltou foi poder de persuasão. Faltou foi influência. Faltou foi um conjunto de argumentos que fizessem sentido. Não apenas para a Globo, evidentemente, mas para a grande imprensa como um todo.
Donos e editores já deveriam há muito tempo ter parado para tentar entender por que sua voz não está sendo ouvida. Você pode fingir que o problema está neles, nos eleitores. Ou pode enfrentar os fatos corajosamente e ver que correções pode fazer em sua trajetória. Alguém já disse e repito aqui: maus editores fazem mais estragos para a imprensa estabelecida do que a internet.
E então chegamos a Marcos Valério. A notícia que parece incendiar os comentaristas políticos é a seguinte: Marcos Valério afirma que Lula era o chefe do mensalão. Mais precisamente: Marcos Valérioteria afirmado.
Foi capa da Veja. Segundo Noblat, a Veja gravou uma fita com a acusação de Marcos Valério.
Vamos considerar o cenário mais favorável a quem é contra Lula: Marcos Valério de fato falou, e a fita existe.
Ainda assim: uma acusação de Marcos Valério tem valor de prova para que se publique e se repercuta com tanto calor? É legítimo publicar o que quer que Marcos Valério diga – sem evidências que as sustentem? Se as há, se existe algo além da palavra duvidosa ainda que gravada de Marcos Valério, retiro tudo o que disse acima sobre o episódio. (Leio agora que a revista decidiu não publicar a suposta fita.)
Em países em que a sociedade é mais avançada, você precisa muito mais do que as palavras de alguém para publicar acusações graves – ou terá que enfrentar a Justiça. Foi o caso célebre de Paulo Francis. Francis teve o azar de chamar diretores da Petrobras de corruptos em solo americano. Os acusados puderam processá-lo na Justiça americana. Onde as provas? Os amigos dizem que Francis morreu por conta do desgaste emocional deste caso, e acredito. Se o processo corresse na Justiça brasileira, não daria em nada, evidentemente.
Um dia o jornalismo brasileiro terá também que fazer uma autocrítica em relação ao caso Collor. Não que se tratasse de um caçador de marajás. Mas o que mais pesou em sua queda foram palavras – a famosa entrevista de Pedro Collor. Estava certo publicar o que Pedro Collor afirmara como se fosse verdade indiscutível?
Na época, quando conversava com outros jornalistas sobre a capa de Pedro Collor, a pergunta que eu fazia era a seguinte: imagine que o irmão do presidente americano bate na redação do New York Times e conta histórias horríveis. O Times publicaria?
O público não deve entender como alguém que segundo Pedro Collor cometeu tantos crimes acabou sendo absolvido pelo Supremo Tribunal Federal e está aí, militando na política. Não havia provas, segundo o STF. Mas então qual a sustentação da entrevista de Pedro Collor? Palavras? É pouco.
No presente caso, pelo pouco que li, vi a velha cena tão comum nos últimos dez anos. Uma acusação – ainda que partida de Marcos Valério, ainda que sem provas — vai tomando ares de extrema gravidade na grande imprensa. Alguém dá, e depois vem a repercussão previsível. Leio que Merval chegou a falar em cadeia.
O público não me parece tão convencido assim da importância do assunto. Observei que no site da Folha e do Estado o tema não é sequer o mais lido do dia. Ocupava, quando verifiquei, uma modesta quinta posição. Russomano – já nem lembro por que – despertava muito mais interesse no leitor.
O leitor não é bobo. Mas a mídia estabelecida o trata como se fosse, e sua perda de influência deriva, em grande parte, desse erro de avaliação.  Nos dezesseis anos que compreendem as gestões de FHC e Lula, o Brasil avançou consideravelmente. A grande imprensa, infelizmente, não conseguiu acompanhar este avanço.


VALE A PENA LER





Parceria Serra-Globo em SP pode ir além do jingle que é da novela Avenida Brasil e chegar aos telejornais

Plataforma colaborativa mapeia incêndios em favelas paulistanas
Para investigar causas e consequências do fogo frequente – e jamais investigado – projeto cria mapa interativo. Por Mayara Penina, no blog Mural

Superar atraso brasileiro requer investimento público. Mídia prefere opor professores a alunos e sugerir que boa gestão se faz sem recursos... Por Daniel Cara, na Revista Educação

Até advogado de Marcos Valério confirmou que o suposto diálogo de seu cliente com Veja jamais existiu. Mesmo assim, ele foi transformado em "verdade" por alguns dos colunistas mais prestigiados pela velha mídia. Por Marco Aurélio Weissheimerem Carta Maior

INFORMAÇÕES


Gostaria de convidá-los para a estréia do nosso espetáculo OLÚRÓMBÍ – Respeito à Natureza, do Grupo Teatral Apàló – A Bela Arte d’África, vinculado ao Instituto de Inovação Social e Diversidade Cultural (INSOD).
As apresentações acontecerão na próxima semana no Teatro do Centro Cultural da UFMG, nos dias 05 de outubro de 2012 (sexta-feira) às 20:00hs, 06 de outubro de 2012 (sábado) às 19:00hs, com entrada franca.

O CURSO DE CULTURA AFRICANA E AFROBRASILEIRA OBJETIVA AUXILIAR NA DESCONSTRUÇÃO DE ESTERIÓTIPOS SOBRE A HISTÓRIA DA ÁFRICA, CULTURAS AFRICANAS E CULTURA AFRO-BRASILEIRA. DEVERÁ OCORRER NOS SEGUINTES DIAS E HORÁRIOS NA UNIDADE ANTÔNIO CARLOS DO UNIBH, ÀS: SEGUNDAS-FEIRAS DE 19:00 ÀS 22:00 E TERÇAS-FEIRAS DE 19:00 ÀS 21:00. VALOR DO INVESTIMENTO: 45,00 DE INSCRIÇÃO + 240,00 EM BOLETO OU CARTÃO DE CRÉDITO, PARA 18 HORAS/AULA.



MURAL DO HISTORIADOR: MESTRADO PROFISSIONAL EM HISTÓRIA
O mestrado profissional em história está realmente se tornando uma realidade cada vez mais concreta na área de história. O formato de pós-graduação - que já existe há alguns anos na FGV-RJ e que vem sendo incentivado pela CAPES - acaba de chegar a Universidade Federal do Rio Grande (FURG). [Leia mais]
CAFÉ EXPRESSO NOTÍCIAS: LIVRO DISCUTE CANIBALISMO NO EXÉRCITO JAPONÊS
Segundo pesquisador, ritual ocorreu durante a Segunda guerra Mundial[Leia mais]
ENTREVISTA: MANOLO FLORENTINO ABORDA O TEMA DA ESCRAVIDÃO NO BRASIL
Em entrevista ao Café História, Manolo Florentino, especialista em escravidão no Brasil, fala sobre a complexidade e a riqueza de interpretações que o tema oferece ao historiador[Leia mais]
CINE HISTÓRIA: A FONTE DAS MULHERES
Filme francês discute as tradições de um pequeno povoado no Oriente Médio. [Saiba mais]
DOCUMENTO HISTÓRICO:  CARTAZ AMERICANO DA SEGUNDA GUERRA
Cartaz usava o medo como elemento de mobilização da população e das empresas americanas. [Saiba mais]
EVENTO EM DESTAQUE: ESTUDOS CLÁSSICOS NA UFRJ
Semana de estudos clássicos acontece em outubro no Rio de Janeiro. [Leia mais]

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Numero 345


Leio, hoje cedo, no blog DoLaDoDeLa, que os presidentes dos 3 partidos principais de oposição estão furiosos com as “fantásticas revelações” da revista Veja que o Marcos Valério teria dito numa entrevista que o próprio nega ter dado. Vejam:
Os presidentes dos três principais partidos de oposição divulgaram nota nesta terça-feira cobrando explicações imediatas do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva depois de VEJA revelar que Marcos Valério, o operador do mensalão, aponta o petista como chefe do esquema. "Estranhamos o silêncio ensurdecedor do ex-presidente Lula, que deveria ser o maior interessado em prestar esclarecimentos sobre fatos que o envolvem diretamente", diz a nota.

Sérgio Guerra (PSDB), José Agripino Maia (DEM) e Roberto Freire (PPS) se reuniram nesta terça-feira para discutir a reação da oposição após as revelações de VEJA. Em um trecho da nota, o trio exige resposta do petista: "O ex-presidente já não está mais no comando do país, mas nem por isso pode se eximir das responsabilidades dos oito anos em que governou o Brasil, ainda mais quando há suspeitas que pesam sobre o seu comportamento no maior escândalo de corrupção da história da República". (grifo meu)
Não pude deixar de rir e pensei numa pequena mudança de nomes no primeiro parágrafo. Ele ficaria assim:
Os presidentes dos três principais partidos de oposição divulgaram nota nesta terça-feira cobrando explicações imediatas do ex-presidente FHC e do atual candidato José Serra depois do livro A privataria tucanarevelar que os dois eram os chefes do esquema. "Estranhamos o silêncio ensurdecedor do ex-presidente FHC, que deveria ser o maior interessado em prestar esclarecimentos sobre fatos que o envolvem diretamente", diz a nota.
A justificativa para isso, claro, eles próprios já deram no texto em negrito do segundo parágrafo...
Não é um primor?
Já está dado o primeiro passo para pressionarmos o Ministério Público a investigar o processo de privatização dos tucanos. Adelante!!!

 

 
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A Constituição ignorada

Por Dalmo de Abreu Dallari (publicado no Observatório da Imprensa)
A cobertura do Poder Judiciário pela imprensa, com noticiário minucioso e comentários paralelos, é uma prática muito recente, que pode ter efeitos benéficos em termos de dar maior publicidade a um setor dos serviços públicos que também está obrigado, como todos os demais, a tornar públicos os seus atos, seu desempenho administrativo e a utilização de seus recursos orçamentários.
Entretanto, as decisões judiciais têm várias peculiaridades, entre as quais está o direito de penetrar na intimidade das pessoas e das instituições quando isso for necessário para o bom desempenho do julgador, assim como o fato de que tais decisões, que podem ter gravíssimas consequências para pessoas, entidades e mesmo para toda a sociedade, são inevitavelmente influenciadas por uma escala individual de valores – tudo isso implica a configuração de características especiais, exclusivas das atividades judiciárias e bem diferentes das peculiaridades do Legislativo e do Executivo.
Só isso já seria suficiente para que se exigisse da imprensa uma atenção diferenciada para a cobertura das atividades do Judiciário. Acrescente-se, ainda, que pelas particularidades do processo de obtenção e uso de dados, assim como da fundamentação das decisões dos juízes e tribunais, é indispensável um preparo adequado dos editorialistas e jornalistas que irão publicar informações e opiniões sobre as atividades e as decisões do Judiciário, pois além do risco da existência de erros na matéria divulgada, o que já é altamente reprovável, graves consequências podem decorrer da divulgação de informações e comentários errados e mal fundamentados. Nesses casos a publicidade do Judiciário acarretará mais efeitos nocivos do que benéficos.
Matéria jurídica
O despreparo de importantes órgãos da imprensa para a cobertura do Judiciário tem ficado evidente, tanto pelo tratamento dado às matérias quanto pela ocorrência de erros e impropriedades relativamente a situações e ocorrência pontuais. Assim, por exemplo, num dos mais importantes órgãos da imprensa brasileira, o jornal O Estado de S.Paulo, que ultimamente passou a ser muito vigilante quanto às falhas do Judiciário e muito agressivo nos comentários a elas relativos, foi publicado, na edição de 22 de julho deste ano, num editorial da página 3 – que é um espaço nobre do jornal –, um comentário que, sob o título “A resistência da toga“, pretendia denunciar a persistência da doença do corporativismo no Judiciário.
Para comprovação do que ali se afirmava foi referida a resistência de juízes às boas inovações introduzidas pela Emenda Constitucional nº 45, informando-se, textualmente, para esclarecimento dos leitores, que essa emenda “entre outras inovações, criou o instituto jurídico do mandado de injunção. Na época, entidades da magistratura acusaram esse mecanismo processual – cujo objetivo é agilizar as decisões judiciais, obrigando os tribunais inferiores a seguir a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal – de suprimir as prerrogativas e a autonomia dos juízes de primeira instância”.
Ora, basta uma simples leitura do artigo 5º, inciso LXXI, da Constituição para se verificar a absoluta impropriedade da afirmação constante do editorial. Com efeito, nos termos expressos daquele inciso constitucional “conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”.
Como fica mais do que evidente, quem escreveu o editorial não tinha conhecimento do assunto e não houve assessoria nem revisão de algum conhecedor. Provavelmente, o editorialista tinha ouvido falar que estavam sendo propostas inovações constitucionais para melhorar o Judiciário e uma delas dava efeito vinculante a certas decisões do Supremo Tribunal Federal, obrigando os órgãos do Poder Judiciário a seguirem a mesma orientação, o que tinha sido mal recebido por alguns integrantes do Poder Judiciário. Trata-se, neste caso, da súmula vinculante, prevista entre as competências do Supremo Tribunal Federal no artigo 103-A da Constituição, inovação que absolutamente nada tem a ver com o mandado de injunção.
Houve erro evidente do editorialista, mas também ficou evidenciado o despreparo de um importante órgão da imprensa para a cobertura do Judiciário. Pode-se imaginar quantos equívocos dessa natureza podem estar contidos nas informações e nos comentários sobre matéria jurídica, que pretendem informar e formar os leitores, como se tem considerado inerente ao papel da imprensa.
Extensão inconstitucional
Há um ponto em que a imprensa poderia promover um sério debate, com base numa questão jurídica fundamental: por meio da Ação Penal 470, estão sendo julgados pelo Supremo Tribunal Federal, sem terem passado por instâncias inferiores, acusados que não tinham cargo público nem exerciam função pública quando participaram dos atos que deram base à propositura da ação pelo Ministério Público. Isso ficou absolutamente evidente no julgamento de acusados ligados ao Banco Rural, que, segundo a denúncia, sem terem cargo ou função no aparato público, interferiram para que recursos públicos favorecessem aqueles integrantes de um banco privado.
Essa questão foi suscitada, com muita precisão, pelo ministro Ricardo Lewandowski, na fase inicial do julgamento. Entretanto, por motivos que não ficaram claros, a maioria dos ministros foi favorável à continuação do julgamento de todos os acusados pelo Supremo Tribunal. No entanto, a Constituição estabelece expressamente, no artigo 102, os únicos casos em que o acusado, por ser ocupante de cargo ou função pública de grande relevância, será julgado originariamente pelo Supremo Tribunal Federal e não por alguma instância inferior.
No inciso I, dispõe-se, na letra “b”, que o Supremo Tribunal tem competência para processar e julgar, originariamente, nas infrações penais comuns, “o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador Geral da República”. Em seguida, na letra “c”, foi estabelecida a competência originária para processar e julgar “nas infrações penais comuns e nos crimes de responsabilidade, os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, os membros dos Tribunais Superiores, os do Tribunal de Contas da União e os chefes de missão diplomática de caráter permanente”.
Como fica muito evidente, o Supremo Tribunal Federal não tem competência jurídica para julgar originariamente acusados que nem no momento da prática dos atos que deram base à denúncia nem agora ocuparam ou ocupam qualquer dos cargos ou funções enumerados no artigo 102.
Para que se perceba a gravidade dessa afronta à Constituição, esses acusados não gozam do que se tem chamado “foro privilegiado” e devem ser julgados por juízes de instâncias inferiores. E nesse caso terão o direito de recorrer a uma ou duas instâncias superiores, o que amplia muito sua possibilidade de defesa. Tendo-lhes sido negada essa possibilidade, poderão alegar, se forem condenados pelo Supremo Tribunal, que não lhes foi assegurada a plenitude do direito de defesa, que é um direito fundamental da cidadania internacionalmente consagrado. E poderão mesmo, com base nesse argumento, recorrer a uma Corte Internacional pedindo que o Brasil seja compelido a respeitar esse direito.
A imprensa, que no caso desse processo vem exigindo a condenação, não o julgamento imparcial e bem fundamentado, aplaudiu a extensão inconstitucional das competências do Supremo Tribunal e fez referências muito agressivas ao ministro Lewandowski – que, na realidade, era, no caso, o verdadeiro guardião da Constituição.
***
[Dalmo de Abreu Dallari é jurista, professor emérito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo]

No número passado, coloquei, logo na introdução, algumas observações sobre Portugal, enviadas pela minha ex-aluna Cléria. Hoje publico uma síntese da dissertação de mestrado que ela irá defender amanhã, dia 20, lá mesmo.

O Tokoismo como Elemento da Identidade Angolana.
1950-1965
Desde a sua chegada ao continente africano no final do século XV, os portugueses procuraram legitimar as suas acções comerciais e de colonização utilizando o factor religioso, tendo ao longo dos séculos, estabelecido vários mecanismos de implantação do catolicismo. A simples afirmação do historiador congolês Elikia M`Bokolo: “a arma do colonizador virara-se contra ele”1 torna-se particularmente pertinente, pois põe em evidência a capacidade de mudança que os africanos tiveram através da integração de “novidades” introduzidas pelo cristianismo europeu, com objectivo de estabelecer relações profícuas, mas também assegurar a sua hegemonia regional, preservando ao mesmo tempo valores culturais africanos fundamentais.

O contacto de duplo interesse convergiu num processo de desconfiança à medida que os europeus, com suas técnicas de organização, se mostravam controladores e autoritários obrigando os africanos a tomarem posse das práticas ocidentais no sentido de proteger o próprio espaço territorial e cultural. Mas, o trabalho a ser apresentado como conclusão do curso de Mestrado em História de África tem como prioridade, analisar esta relação no contexto religioso cristão em Angola, onde a missionação teve papel importante de intermediária, modificando o comportamento do homem angolano, proporcionando-lhe um reajuste no modo de compreender e moldar a “nova” realidade de integração, usando os mecanismos europeus a seu favor.

Dentro desse contexto religioso de interesses entre africanos e europeus, o estudo desenvolvido tem como tema central: O Tokoismo como elemento da identidade angolana (1950-1965). A temática surgiu no decorrer dos trabalhos realizados nos seminários académicos, onde foram abordadas as actividades da missionação católica, nas colónias africanas de Portugal, nos finais do século XIX. Com as leituras de uma vasta bibliografia sobre as missões, tanto católicas como protestantes, apoiadas por uma série de literaturas historiográficas, foi observado várias referências acerca das chamadas igrejas independentes ou igrejas autóctones surgidas nas primeiras décadas do século XX após a implantação do aparelho colonial no Continente Africano.
Embora, originadas das relações dos africanos com os missionários europeus foram conceituadas, pelo colonizador, de “seitas”, “profético-messiânicas” e “movimento religioso de cunho subversivo.” Factor este que se aplica também a uma determinada construção historiográfica em que a missionação europeia é elevada como parte da história do continente africano, sobrepondo-se às igrejas autóctones as quais são destacadas como movimentos independentistas.

Numa intervenção feita no ISCTE, em Lisboa, O historiador francês, René Pélissier2 destacou as teses defendidas na actualidade, as quais considerou ser um importante problema para a historiografia de África e, em particular, as que se debruçam sobre a pertinência da independência de Angola. Partindo desta premissa, verificou-se em muitas literaturas contemporâneas ao período, a igreja angolana Tokoista analisada sob os mesmos paradigmas coloniais que, para além dos conceitos acima, foi também considerada pelas autoridades do Estado Colonial Português como perturbadora e desmoralizadora que representava perigo por influenciar negativamente a população da Província angolana no sentido de atentar contra o sistema de colonização instaurado. Foi também observado que estes textos serviram de fonte a outros estudos desenvolvidos após a independência que, de forma positivista analisaram a Igreja africana mais como um fenómeno autónomo da política interna de independência mas, de forma paralela e mesmo objectivo. Porém, com o contacto directo com uma gama de documentos primários, disponíveis nos arquivos nacionais de Lisboa (A. N. Torre do Tombo, A. H Ultramarino, A. H. Militar e Arquivo Salazar), constatou-se que, das relações dos africanos com os europeus, surge uma nova expressão religiosa composta por valores cristãos e a ancestralidade kongo em que é observada a preservação da identidade dos povos de cultura Bantu.

O trabalho foi organizado de modo a apresentar o “movimento” Tokoista, a sua origem e formação, o seu processo de desenvolvimento e integração social e o seu impacto na re-construção da identidade angolana. O contexto histórico da região, centra-se nas alterações introduzidas pela administração colonial que procurava desviar a atenção das reais intenções portuguesas de manter as colónias, num momento em que se verifica o desencadeamento dos processos de independência reivindicada pelas populações dominadas e apoiada pela comunidade internacional. Neste sentido, o período (1950-1965) adoptado para balizar este estudo é revelador de acontecimentos reflectidos na igreja de Simão Gonçalves Toko sendo, os exílios, desenvolvimento na clandestinidade e prisões de seus adeptos.

A conclusão que se chegou com esse estudo, sustentado de uma profunda análise das correspondências de homens e mulheres tokoistas, interceptadas pelos agentes da PIDE (Polícia Internacional de Defesa do Estado), constata-se que a referida igreja, ao contrário de como foi apresentada em prol de uma historiografia linear, sem apreciação dos vínculos culturais, originou-se com base nos recursos identitários em que a sua dinâmica revela a leitura que os africanos fizeram do cristianismo, adotando-o como mecanismo de integração social num período em que a maioria da população de Angola foi excluída do projecto de colonização português.
Cléria Ferreira,
Lisboa, Setembro de 2012
Notas:
1 Elikia M`Bokolo, África  egra – História e Civilizações do Século XIX aos nossos dias. Tomo II, 2ª ed.Colibri, Lisboa, 2007, p. 466.
2 René Pélissier, “Guerra, Descolonização e contexto internacional” in: Colóquio Vozes da Revolução:guerra colonial e descolonização, Lisboa/ISCTE/IUL, 15-16 de Abril de 2010.


VALE A PENA LER



Perguntas para fazer a um historiador
Às vésperas dos processos seletivos para programas de pós-graduação em história, Keila Grinberg reflete sobre a escolha dessa carreira, sobre o que faz de um projeto um bom projeto e de um historiador um bom historiador.

Repressão popular


Mitologia: mecanismo de memória



Como acabar com a fome sem uma agricultura devastadora
Estudos mostram que é possível aumentar a produção de alimentos com uso racional da água, diminuição de fertilizantes, mudanças alimentares e comércio justo. Por Ricardo Coelho, na Esquerda.net
Célio Turino fala sobre mudança no ministério da Cultura
Para idealizador do Programa Cultura Viva, Ana de Hollanda quebrou emergência dos movimentos culturais, que marcou mandatos de Lula; já Marta Suplicy "compreende o papel da Cultura Digital". Por Bruno de Pierro, em Brasilianas
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Regiões serão vendidas, terão poderes desvinculados do Estado nacional e poderão definir até política imigratória própria. Movimentos sociais qualificam decisão de "catástrofe" e apelam à Corte Suprema. Por Fillipe Mauro, no Opera Mundi
Talvez duas crianças tenham morrido para você ter seu celular”
Como fabricantes de aparelhos, aliados a exércitos mercenários, detonam a África, para controlar comércio de minerais indispensáveis à produção dos telefones. Por Inés Benítez, na IPS
O modo pós-capitalista de estar no mundo
Alternativa contemporânea ao sistema constrói valores e relações sociais opostas às dominantes. Por isso, é tão poderosa, diz Ricardo Abramovay, em entrevista a Inês Castilho
Para romper o novo impasse do clima
Por que estão novamente travadas as negociações para frear o aquecimento global. Quais os grandes responsáveis. Há saídas? Por Walden Bello e Pablo Solon
Europa: Outono Quente para reconstruir a democracia
Ignacio Ramonet saúda novas mobilizações sociais e sustenta, em diálogo com Zygmunt Bauman: “são caminho para novo sistema político”


Assim Portugal desafia a troika
Centenas de milhares encaram, nas ruas, corte de direitos. Novidade: manifestações combinam protagonismo da sociedade civil com objetivos políticos claros.
Por Antonio Jimenez Barca,
Para derrotar a especulação com alimentos
Megafundos financeiros dominam bolsas de commodities, manipulam preços e podem desencadear nova crise alimentar. A Unctad, uma agência da ONU, tem proposta radical contra isso. Por Jean Ziegler
Nada queima por acaso nas favelas paulistanas
Estudo estatístico mostra notável coincidência entre os incêndios e... áreas de interesses do mercado imobiliário. Por João Finazzi, do PET-RI da PUC

Opera Mundi - Relatório indica que polícia paraguaia provocou massacre anterior à queda de Lugo

Da Cruz à Estrela: a trajetória da Ação Popular Marxista-Leninista
ESTHER KUPERMAN
A organização clandestina denominada Ação Popular Marxista Leninista (APML) surgiu da transformação do grupo de orientação católica, a Ação Popular, em agremiação de diretrizes marxistas. A matriz da APML, a antiga Ação Popular (AP), por sua vez, foi formada em Belo Horizonte (M.G.), em 1962, a partir de grupos de operários e estudantes ligados à Igreja Católica: a Juventude Operária Católica (JOC) e a Juventude Estudantil Católica (JEC)... LEIA NA ÍNTEGRA: http://espacoacademico.wordpress.com/2012/09/15/da-cruz-a-estrela-a-trajetoria-da-acao-popular-marxista-leninista/

 Nenhum a menos: tornar-se professora – Uma pedagogia dentrofora da escola
ARISTÓTELES BERINO
Em uma escola primária, na aldeia Shuiquan, zona rural da China, professor Gao precisa se afastar por um mês das suas atividades. Uma professora substituta ficará com a turma no período. Mas ao recepcionar a substituta recrutada pelo prefeito, o experiente professor logo desconfia das suas capacidades. Com treze anos e sem ter terminado o ginásio, professor Gao não acredita que Wei reúna as condições necessárias para lecionar na turma multisseriada (alunos da pré-escola à 3ª série) que receberá... LEIA NA ÍNTEGRA: http://espacoacademico.wordpress.com/2012/09/19/nenhum-a-menos-tornar-se-professora-uma-pedagogia-dentrofora-da-escola/


 INFORMAÇÕES



Cinco milhões de páginas digitalizadas à disposição dos interessados, assim é a Hemeroteca Digital Brasileira, lançada oficialmente em agosto e disponível para consulta gratuita no site da Biblioteca Nacional.



ÚLTIMA HORA: SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA 2013 JÁ TEM DATA, LOCAL E TEMA 
Evento acontece em julho de 2013. Página na internet já está no ar e o cronograma disponível. [Leia mais]
MURAL DO HISTORIADOR: PRÊMIO MEMÓRIAS REVELADAS
As inscrições para a Edição 2012 do Prêmio de Pesquisa Memórias Reveladas ocorrerão do dia 5 de setembro de 2012 ao dia 28 de fevereiro de 2013. O Prêmio de Pesquisa Memórias Reveladas é um concurso de monografias com base em fontes documentais referentes ao período do regime militar no Brasil (1964-1985). E não perca também na seção: novo livro discute a relação entre o ISEB, os militares e a imprensa no Brasil (1955-1964) [Leia mais]
CAFÉ EXPRESSO NOTÍCIAS: ABL RECONHECE CENSURA DURANTE PALESTRA
Episódio ocorreu durante conferência dada por Jorge Coli. [Leia mais]
CINE HISTÓRIA: TROPICÁLIA
Está em cartaz nos cinemas o novo documentário de Marcelo Machado, "Tropicália". O documentário - produzido em 2012 - é uma uma análise sobre o importante movimento musical homônimo, liderado por Caetano Veloso e Gilberto Gil no final dos anos 1960. [Leia mais]
DOCUMENTO HISTÓRICO: CARTAZ DA GUERRA CIVIL ESPANHOLA
Os cartazes eram colados com frequência no postes das ruas espanholas, sobretudo Madrid. Na primeira metade do século XX, tais impressos foram utilizados amplamente em prol da divulgação de ideias politicas. [Saiba mais]
CONTEÚDO DA SEMANA: CONFERÊNCIA DO HISTORIADOR QUENTIN SKINNER
Conferência de Quentin Skinner, proferida na abertura do Ano Académico 2011 - 2012, no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, em 20 de Outubro de 2011. [Leia mais]

MURAL DO HISTORIADOR: LIVRO SOBRE A DITADURA NA BAHIA PARA DOWNLOAD
O livro “Ditadura militar na Bahia: novos olhares, novos objetos, novos horizontes”, de Grimaldo Carneiro Zachariadhes (Org.) pode ser baixado gratuitamente na internet. O livro contém 13 textos que abordam o período em diferentes perspectivas.E não perca também a chamada da Revista Brasileira de História Oral. [Leia mais]
CAFÉ EXPRESSO NOTÍCIAS: 25 ANOS DA TRAGÉDIA DO "CÉSIO-137"
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Baseado no romance de Hunter S. Thompson, O Diário de um Jornalista Bêbado conta a improvável história do jornalista itinerante Paul Kemp (Johnny Depp). [Leia mais]
NOTÍCIA DE ÚLTIMA HORA: DOCUMENTOS DO DOPS/MG NA WEB
Mais de 250.0000 imagens de documentos do Departamento de Ordem Política e Social de Minas Gerais já podem ser consultados no site do Arquivo Público Mineiro. [Saiba mais]
DOCUMENTO HISTÓRICO:  PROPAGANDA ELEITORAL DE ADHEMAR DE BARROS
Propaganda Política de 1955 Adhemar de Barros evoca Getúlio Vargas, morto há apenas um ano, para pedir votos aos eleitores nas eleições presidenciais daquele ano. [Saiba mais]
CONTEÚDO DA SEMANA: GRUPO DE ESTUDO SOBRE EDUCAÇÃO
Grupo de Estudo dedicado a "Mudanças Práticas na Educação Brasileira"[Leia mais]